Falta pouco para 2023…

“Pois é. Chegamos até aqui. E que ano!”

Rubi havia decidido mudar. Ela e seu companheiro de batalhas estavam cansados, após enfrentar inúmeros conflitos intergalácticos e buscar manter sua moral e o bem dentro de si vivos, perceberam que precisavam parar. Parar de lutar e descansar. Sim, nossos guerreiros que embarcaram em uma aventura em sua nave espacial rumo ao desconhecido sem data para voltar se viram regressados ao seu local de origem. Mas não eram mais os mesmos.

Traziam feridas antigas. Ela gostava de crer que resistiu por ele todo este tempo. Mas terá sido apenas isso mesmo? Afinal, ninguém deixa a corporação interestelar apenas por um companheiro. Não ela. Rubi não faria isso. Mas o via desgastado, sem âmbito, prestes a sucumbir a alguma trampa maligna que os senhores do tempo e das sombras colocavam em seus caminhos diariamente.

Eram muitos enigmas a decifrar. Eram muitos seres para conhecer e confiar sem ao menos ter o devido tempo. E a corporação em si mostrava indícios de uma falência moral crescente e que não dava tréguas, punindo a todos ao redor que pudessem parecer traidores da Armada. Tudo isso junto, unido ao fato que os dois visualizaram outro horizonte, onde pudessem ter paz no coração e a tranquilidade de ver seus companheiros até seu último dia.

A jornada nas estrelas veio a findar. Recolheram as fardas, entraram no prédio do Controle Mestre e assumiram: não dá mais. Imediatamente e sem nenhuma pergunta foram convidados a se desligar. Como se não fossem importantes aqueles anos de estrada, tantas batalhas enfrentadas, tantas defesas pela Armada, mas foi assim. Sim, é isso, tchau. Simples rápido e direto.

O companheiro de Rubi sentiu-se mal. Depois de tanto tempo ruminando a hipótese, de repente, ela concretizada, lhe parecera mais como um pesadelo. Quis desistir, voltar atrás, talvez nunca esteve certo de haver decidido isso de fato, talvez tivesse apenas cogitado, talvez estava apenas especulando para descobrir seu real valor… como costumava fazer em seus relacionamentos com pessoas e devido ao seu passado de decepções. Talvez ele quisesse apenas ser ouvido. Estava doente, em uma das batalhas fora ferido em seu coração gravemente. Na luta contra um senhor muito capaz de controlar o tempo e mentes o Guerreiro havia digladiado valentemente em ambientes de espelhos e enigmas, onde fora posto a prova em sua moral e estigma. De volta a Armada, depois de lutar ferozmente, percebeu que o senhor das confusões havia também ferido sua reputação. Se antes era apenas um soldado mais, agora duvidavam de sua fidelidade, justiça, lealdade… Tudo isso fê-lo sofrer em seu interior e, embora a batalha contra aquele mal houvesse ganhado, a sua batalha pessoal sobre quem era ainda estava em curso, afinal essa só acaba quando nós vencemos o tempo da vida. O Guerreiro de Rubi então, depois de anos lutando por sua liberdade mental, viu-se aprisionado em um conflito onde ele se via como um possível desleal, visto por muitos, incompreendido, sem moral e reputação, além de seu corpo físico estar terrivelmente fraco e indisponível para mais uma batalha física.

Ao seu lado Rubi enfrentava as batalhas dele, sendo sua auxiliar oficial, copiloto na sua nave, ela vivenciara as mesmas questões, embora por ser mais bem formada, ela conseguia combater na mente estes conflitos e assumia prejuízos físicos pelas suas escolhas com honra. Mas seu capitão dependia de aprovação dos superiores. Ela o viu sucumbir a cada palavra que lhe dirigiram, ela via os olhares de desdém pela decisão do Guerreiro capitão, ela sabia o quanto ele sofria… Mas mantinha a cabeça erguida e buscava no Alfa e Ômega a força que precisava para seguir em frente. Foram anos observando, suportando, desviando o olhar da real situação…até que ele mostrou que não aguentava mais. Então ela decidiu que ele devia buscar ajuda. E foi o que fizeram.

A Armada era um grande grupo de soldados escalados que trabalhava em nome da autoridade máxima do Universo, recrutando soldados e alinhando-os nas batalhas mais diversas ao longo da existência. Como oriundos de soldados, também tinha suas fraquezas estruturais e buscava manter-se firme, mesmo em meio a problemas graves que se levantavam contra o grupamento. Lutavam, diziam, em nome da causa do AlfaeÔmega. E, embora unânimes. muitos apresentavam suas próprias maneiras de batalhar e gerir suas naves rumo ao desconhecido. A princípio todos lutavam contra o mal comum, os Contratempos e Devoradores de almas que trabalhavam arduamente para atrasar e impedir o cumprimento das Profecias do AlfaeÔmega. Aliás, os inimigos eram inúmeros e bem ajustados, antes atuando apenas externamente, mas então começaram e dominar as mentes de alguns soldados e puderam agir sorrateiramente através deles dentro da corporação. Era impossível saber os contaminados ou os puros, assim, atuavam todos em conjunto. Enquanto os contaminados pelos Devoradores de Almas seguiam o curso fingindo ou tentando acreditar que estavam no propósito certo, os puros atuavam e mostravam resultados, nem sempre visíveis devido ao caráter radioativo da sua ação, seus efeitos apenas surgiam potencialmente depois de anos.

E no meio de tudo isso estavam Rubi e seu Capitão Guerreiro de Rubi.

Os dois se amavam, se cuidavam mutuamente, riam juntos. Rubi buscava compreender fraquezas do seu capitão, e tentava amenizar seus efeitos, ele sempre muito estressado e preocupado era muito intenso em suas ações e decisões, nem sempre ponderando muito quando atuar ou quando esperar. Mas mesmo assim Rubi via um mover extraordinário através de uma vida simples, ela via o Alfa e Ômega no seu capitão. Assim os dois seguiram seu curso, indo de planeta em planeta para plantar sementes de vida nova, algo revolucionário que Alfa e Ômega havia lhes presenteado também.

O relacionamento com o Gestor do Universo é bem dinâmico, constante e nem sempre perceptível. Diariamente colhemos informações sobre as sementes com o Livro Manual do gestor, onde ele deixa decifráveis enigmas para que os soldados possam saber como atuar no momento de plantar Suas sementes. Para restaurar o equilíbrio do Universo, quebrado com uma rebelião ocorrida em algum momento no espaço-tempo, o Gestor enviou o Alfa e Ômega. Este era o senhor da Armada. Na mesma muitas organizações e subdivisões chamadas por ele atuavam para recrutar soldados que tiveram o devido Restaurar para servir como jardineiros de novas plantações de Vida Nova. Uma carreira linda, promissora, mas muitas coisas ameaçam a ação destes agentes nos diferentes mundos onde atuam. Rubi e seu Capitão mantinham um processo diário de audição das informações para manter-se atualizados quanto aos procedimentos. Mas isso foi maculado por batalhas contra agentes dos inimigos que tornaram a sua realidade difícil de discernir. A Armada também começou a parecer mais confusa, obscura. Mentiras, falsos testemunhos públicos, documentos e a própria desconfiança em quem havia agido com total integridade em uma batalha deixaram dúvidas sobre a segurança que a corporação oferecia a seus membros. E embora o Alfa e Ômega não os abandonasse, veio o questionamento do quanto os Devoradores de Almas não haviam também usurpado dentro da Armada. Havia muitos insatisfeitos e inseguros em relação ao real trabalho que estavam exercendo. Nebulosamente também ficava a relação com seu Gestor, considerando que a instituição passava informações dele que não coincidiam com o Manual. Estar todo o tempo filtrando isso, a desconfiança, as dores, e tudo junto levaram o capitão a uma decisão. Não buscar ajuda. Decidiu expor sua insatisfação, protestar ameaçando sair. Para sua surpresa, não fizeram questão que ficasse. E ele foi.

Rubi e o Guerreiro então deixaram a nave, entregaram as chaves, fizeram o dever de casa e voltaram a seu lugar de origem. Recomeçar do zero. Como estar apenas com o Alfa e Ômega sem a direção da Armada? Um certo medo os invadiu. Mas Ele não desampara ninguém. E os fortaleceu e se levantaram. Pessoas amadas cuidaram deles, enviadas pelo Gestor, ajudaram a não deixar que desanimassem, cada um deu um pouco. Se levantaram.

O ano de 2022 foi esse movimento de se reerguer. Os dois levantando a cabeça aos poucos, cuidando das feridas abertas. Respeitando o luto de haver se desligado da carreira que lhes fora proposta. Mas sem desviar o foco. Os dois andaram por dias difíceis, de lágrimas, dores, enfermidades, vencendo a si mesmos, trocando os curativos, foi muito doloroso. Mas alcançaram este dia. e por isso suspiraram, sorriram, respiraram fundo e disseram:

“2023. Pois é. Chegamos até aqui. E que ano!”

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